Sublimes Conversações

Ou conversações sublimes sobre literatura. Um clube do livro. Uma roda de leitura. Quase um grupo de auto-ajuda. Amigos que nunca se viram sentando-se em volta da fogueira para ouvir histórias contadas por aqueles que vieram antes. Ou em cafés do século XIX. Entre, puxe uma cadeira ou ponta do cobertor, encha sua xícara de chá. Seu copo de "vinho, poesia ou virtude". Embriague-se de letras. Pré requisito indispensável: querer. Bem-vindo a todos.

domingo, 16 de março de 2008

Impressões gerais de outros leitores

Essas são as impressões de Formiga Irmã - vulgo Bibi, vulgo “O Baru”, também conhecida como Viviane – sobre o nosso livro. Lembro que quem quiser fazer o mesmo, basta enviar o texto para mim ou para Rosi, ou Bellinha que nós publicamos – com os devidos créditos, é claro.


"Li os dois volumes do Tolstói nas minhas férias de janeiro. Estava na praia e choveu muito! A casa tinha apenas televisão aberta e nada de internet. Nos dias de chuva, meus dias se resumiam a TV e a leitura.

Gosto muito do universo de século XIX: roupas, descrições e a tranqüilidade em relação à leitura. O historiador Peter Gay diz que no século XIX a leitura era uma diversão, um prazer. Os romances eram as novelas ou o Big Brother de atualmente. Hoje isso se perdeu. Há uma profusão de informações e ler um folhetim acaba sendo algo meio prosaico e anacrônico. A leitura perdeu o status de divertimento e se apresenta com um caráter formativo e mais digno do que a TV.

O historiador Peter Gay, no livro “A Educação dos Sentidos”, analisa a experiência burguesa do século XIX através do diário de uma mulher casada. Ele explica que os códigos daquela época não eram tão rígidos e estreitos como supúnhamos e a mulher casada poderia desfrutar de sua sexualidade com o seu marido ou com seu amante. Esse autor contesta veementemente a idéia de que só os homens possuíam amantes e suas esposas viviam anestesiadas sexualmente. Entretanto, aceitava-se o amante, mas não a separação.

E foi esse viés que o livro me prendeu: o adultério. Fui capturada pelo casal Vronski e Ana. Por que Ana não manteve Vronski como amante e permaneceu fiel a estrutura de seu casamento? Há, no começo do livro, uma amiga que a incentiva manter o casamento e o relacionamento com Vronski. Mas Ana não aceita essa situação. Ela quer mais em um século em que a mulher não podia tanto. Há algo de uma morte anunciada, de uma tragédia, do inevitável que encanta, mas também amedronta. Ana foi a Moscou ‘salvar’ o casamento do seu irmão, no caminho conhece a mãe de Vronski e antes deles se conhecerem a paixão já existe. Vocês já se apaixonaram por alguém antes de conhecer? Eu já. A mãe prepara o caminho do filho, o caminho para o inferno.

Antes de conhecer Vronski pensei que seria um patife. Ao longo do livro, ele se apresenta belo, digno e desgraçado. Forte e decidido em seu amor. Após conhecer Ana, ele percebe que sua vida só teria sentido ao lado dela e se resigna. E, depois da sua morte nada mais sobrou.

Ana Karênina é uma heroína do século XIX, logo está presa a algumas determinações da época. Mas mesmo assim, ela encanta pela força. Ela precisava viver intensamente o amor, mas precisava ser aceita socialmente e isso já era pedir demais. Ela escolhe a loucura à exclusão e comete o ato derradeiro e extremamente forte: o suicídio.

Gostei muito do casal Liêvin e Kitty. Embora ache Liêvin excessivamente ingênuo. Há uma beleza na pureza como ele questiona o mundo. Destaco como o parágrafo mais belo o que se refere à monotonia de seu casamento. A distância que há entre a teoria e a prática, o sonho e a realidade. A idéia de que existe um final feliz em que a paz reinará para sempre.

Havia dois meses já que Liêvin se casara. Era feliz, mas não como o esperava. A cada passo surgiam decepções, embora compensadas por imprevistos encantos. Era feliz, é certo, mas, ao princípio a sua família, via-se reconhecer a cada instante que era muito diferente do que sempre imaginara. Exatamente como aquele que depois de admirar o barquinho que singra, sereno e ligeiro, pelas águas de um lago, verifica, ao pôr os pés a bordo, que não basta ir quieto lá dentro, mas que é preciso estar atento a todo o momento ao rumo a seguir e à água que lhe corre por baixo, e que tem de remar e que lhe doem as mãos não acostumadas aos remos, outro tanto ocorria com o seu casamento. Em suma: era bem mais fácil olhar, pois, o barco que faze-lo singrar.


Bem, deixo-os com essas impressões e o convite a mantermos nosso grupinho de leitura unido e que a leitura seja de fato um prazer".

quarta-feira, 12 de março de 2008

Ana Karenina.

Terminei de ler Ana Karenina, e confesso (por favor, não me matem) eu não gostei. Como foi a primeira obra russa que li, atribuo esta minha rejeição a falta de familiaridade com a literatura russa. A história é linda e trágica, mas acho que o texto de Tolstoi por ser rico em detalhes (até d+) é muito longo, talvez se a história tivesse metade dos capítulos que tem cativaria mais. O pulo do gato de Tolstoi, e que chamou minha atenção foi colocar como protagonista uma pessoa que foge completamente do estereótipo de boa menina. Ana que a principio se mostrava uma recatada e dedicada dona de casa e boa mãe, mas que se perde de amores por um “fedelho” que mal sabe o que quer da vida e que não tem maturidade suficiente para encarar todos os percalços de uma relação proibida. Ana além de adultera se revela ao longo da história, uma mulher egoísta e de personalidade fraca, que se perde no vício e não tem coragem de encarar a realidade de frente usando o suicídio como escape. Bem diferente do que vemos em romances clássicos como este, o par romântico da trama não cativa. Interessante foi ver retratada a sociedade russa da época, que não era tão tradicional e puritana como eu pensava, havia principalmente nas mulheres uma certa ousadia comportamental, imagino a discussão que o livro deve ter causado na época. O grande deleite do livro sem dúvida (e o que me fez terminar o livro) é a história paralela de Liévin e seus conflitos, por quem é difícil não se apaixonar, desde que entra na história rouba a cena, o que só serviu para enfraquecer ainda mais o enredo principal. Então que venha o próximo livro, quem sabe minha receptividade para o próximo “russo” seja melhor.

segunda-feira, 10 de março de 2008

Já que ninguém se habilita, começo eu...


Pode parecer que eu já falei o suficiente aqui sobre o livro Ana Karenina, de Tolstoi, mas com certeza eu não falei nem um terço do que poderia ser falado. E nem tenho a pretensão, com este texto, de esgotar o assunto. Coloco minhas impressões sobre certos aspectos do livro.

O que eu gosto nesse tipo de romance “realista” (com mil aspas) é exatamente a descrição minuciosa de roupas, comidas e hábitos. Descrições de um tempo que eu não vivi – e devo confessar que eu tenho uma certa quedinha pelo século XIX. Adoro quando as personagens “fazem a toalete”, “fumam charutos após o jantar nos gabinetes”, possuem escrivaninhas com papéis bordados com iniciais e lacres de cera quente com mensagens importantíssimas como um convite para o chá das cinco – e que são mandadas por criados em bandejas de prata, devendo, estes, esperar pela resposta - isso sem contar as refeições elaboradas com diversos pratos (chega a me dar água na boca a descrição de coisas que eu nunca sequer comi e nem sei como são).

Como um exemplo, cito a descrição de Ana em um baile, logo no início do livro, mais ou menos:


“Uma toalete de veludo preto, muito decotada, desnudava-lhe os ombros esculturais, que lembravam velho marfim, assim como o colo e os braços roliços, de pulsos finos. Rendas de Veneza lhe guarneciam o vestido. Nos cabelos negros, sem postiços, ostentava uma grinalda de amores-perfeitos, combinando com outra que lhe adornava a fita preta do cinto, rematada por rendas brancas. Estava penteada com muita simplicidade. Apenas alguns caracóis de cabelo frisado na nuca e nas fontes se lhe eriçavam, rebeldes. Em volta do pescoço bem torneado brilhava um fio de pérolas”.

Melhor do que isso só se ela tivesse um camafeu! Adoro camafeus!

Eu gosto desse tipo de descrição, porque eu acho que é disso que é feita a literatura. Não, calma, amigo leitor. Não me refiro a minúcias e detalhes, mas a literatura – talvez toda a arte, não sei; aqui me deterei na literatura – vive dos detalhes. A literatura tem o poder de estender os tempos, concentrar as ações, ou vice versa – ou até, muitas vezes prescindir delas –; enfim, de fazer recortes da realidade e apresentá-la não como ela é, mas como o artista a vê. Porque o que interessa em literatura não é, necessariamente, a história contada, mas a forma como é contada. E essa forma, para mim, tem o poder de recriar ambientes, atmosferas, mundos particulares. Cores, cheiros, tons. Muitas vezes o que me fica depois da leitura de um livro é um tom. Uma cor. Um sentimento. Gosto de saborear as palavras, principalmente quando são palavras pouco usuais ao nosso tempo ou país.

O casal Kitty e Liêvin é adorável. Como não gostar deles? São espécie de coadjuvantes que roubam o romance. Tá, não são tão coadjuvantes assim, mas o casal principal é Ana e Vronski, o homem por quem ela se apaixona e larga o marido. Vronski, inicialmente, demonstra um ligeiro interesse por Kitty, que por sua vez faz pouco caso dos sentimentos de Liêvin, enamorada que estava de Vronski. Após perceber que este nada queria a sério com ela, cai em depressão profunda. Liêvin, muito triste com a negativa de Kitty, também se isola em sua propriedade rural, centrando-se única e exclusivamente em seus negócios.

Já Formiga Irmã, por exemplo, achou o Liêvin chato e teve profunda compaixão para com Vronski e o seu sofrimento.

Liêvin e Ana são como espelhos: simétricos opostos. Estão ambos por demais envoltos em buscas pessoais. Ora, ora e quem não está, dirão vocês? Mas Liêvin e Ana – que na verdade quase não se encontram a não ser em um breve momento, já quase no final do livro – são seres por demais atormentados com a mediocridade da existência, a meu ver. Logo no início, quando voltam para suas casas, respectivamente (Liêvin para a propriedade rural e Ana para a casa do marido, em São Petersburgo), eles sentem-se aliviados por reverem seus cotidianos de segurança. Só que essa sergurança – como toda segurança, aliás, - é uma ilusão.

Conversava com a Bel lá no meu outro blog sobre o livro e ela me dizia que ficou com a sensação de que Tolstoi desprezava as mulheres, pois, tanto nesse livro como, mais ainda em Guerra e Paz o autor sugere personagens femininas com ricas possibilidades e de repente elas se transformam em um mingau sem sal. Aí eu comecei a me perguntar se realmente existem escritores homens do século XIX que retratem as mulheres com complexidade e riqueza. Pensei em Aurélia, de “Senhora”, de José de Alencar, que compra o marido, mas ainda assim ela se arrepende depois, se apaixona. Mesmo a Sônia, de “Crime e Castigo” que é quase a tábua de salvação de Raskólnikov (me corrijam se eu estiver errada) representa o ideal da Madalena arrependida: isto é, a puta, pecadora que, ciente da sua condição, adquire valor quando se redime. Mas o curioso é que se retrocedermos mais no tempo podemos ver personagens femininas muito mais ricas e intensas – Lady Macbeth, de Shakespeare, por exemplo. Seria uma característica da época vitoriana? Por outro lado, Formiga Irmã me lembra que o historiador Peter Gay, que realizou uma pesquisa nos diários de senhoras do século XIX, nos diz que havia muito adultério entre as senhoras casadas da sociedade. O problema é quando esse adultério vinha à tona publicamente. A prática não era absolutamente condenada, desde que permanecesse em segredo.

E aí é a grande fatalidade de Ana. Seu segredo torna-se público, enxovalhando o nome do marido. Assim como Ema Bovary, personagem de Flaubert, cujo mesmo destino trágico do suicídio aparece no momento em que ela não mais tem escapatória das chantagens do (de quem mesmo? Farmacêutico?). Assim como Luísa, de “Primo Basílio” – pra mim um plágio descarado de “Madame Bovary” – que também adoece em decorrência das chantagens de sua pérfida criada Juliana que descobre o romance entre a patroa e o Primo Basílio.

O que eu quero dizer é que não acredito nessa coisa de escritores “a frente do seu tempo”, “universais” e “atemporais”. Todo escritor é um retratista de sua época, ainda que seu estilo não seja, necessariamente “realista”. Ou alguém duvida da “realidade” de A metamorfose, de Kafka?

Dessa forma, torna-se difícil ver personagens femininas ricas e complexas escritas por homens, no século XIX

Na série, trechos-que-eu-mais-gostei, Formiga Irmã lembra a passagem em que Liêvin compara a vida a um barquinho. Não consigo achar a parte, mas diz mais ou menos que, de longe, quando vemos um barquinho, pensamos que ele está tranqüilo e navega por águas suaves. Só quando estamos dentro dele é que vemos as ondulações e turbulências para que ele não vire. Assim também é a vida.

Eu fiquei bastante comovida pela busca de Liêvin sobre o sentido da vida. Mesmo após a trágica morte de Ana – belíssima, por sinal – o livro ainda se sustenta centrando-se, basicamente, na busca pessoal de Liêvin, que já vinha ao longo do livro. E ao final ele descobre que o verdadeiro sentido da vida é o sentido que damos a ela.

Bom, como diria o Gaguinho, por enquanto é só pe-pessoal. O que acharam do livro? Opiniões? Discordâncias? Pitacos de quaisquer natureza serão bem-vindos.

sexta-feira, 7 de março de 2008

Declaro abertos os trabalhos!

E aí, plebe? Vamos dar início a nossa discussão virtual? Quem leu o livro? Quem gostaria de dizer alguma coisa? O combinado era que cada colaborador desse blog escrevesse um texto falando sobre o livro, tão lembrados? E quem não for e quiser mandar o seu texto pra eu publicar, sinta-se à vontade! carriewhiteaestranha@yahoo.com.br

Acho que o encontro ao vivo vai ficar pro próximo livro, já que pouca gente leu a Anna - só três pessoas, contando comigo (+ Formiga Irmã + Cláudia), até agora e eu nem sei se uma delas, a Cláudia, mora aqui no Rio, so...


Estou passando por problemas técnicos de internet, mas estou em contato.